terça-feira, abril 04, 2006

1- Fantasma...


Rodou o anel no dedo e ajeitou o cabelo num gesto de contida expectativa, fora assim todo o dia.
Funcionava com um objectivo que persistia em camuflar nos gestos e rituais mais rotineiros. O dia parecia ajudar à energia colocada nas tarefas auto impostas. O pão foi comprado cedo, com alegria, mesmo significando ter de abandonar o quente dos lençóis, afinal tinha de se alimentar, e nem o longo olhar com o qual percorreu todas as delícias gastronómicas ali expostas, perspectivando uma aquisição posterior durou mais que breves segundos.
A cama fora feita de lavado porque os lençóis eram demasiados quentes e enrolavam-se de cada vez se virava de noite, teve que ser!

Tinha tempo. Tinha todo o tempo. Estava por sua conta nestes dias que roubara à sua vida quotidiana, para oferecer somente a si. Tinha voltado às origens. Num misto de procura de silêncio, de pessoas, sítios e vivências, que escolhera abandonar, talvez demasiado cedo, mas que nunca se permitiu lamentar.

Agora estava ali, em retiro, muito flexível é certo, mas que tinha objectivos a cumprir. Aquela procura dentro de si implicava não só observar-se, como observar cada detalhe à sua volta e ainda fazer uma arrumação nos fantasmas que povoavam o seu armário.
Não sabia (ou preferia ignorar) quanto, da sua energia e dos seus objectivos colocava no confronto com um fantasma em particular. Um fantasma tão imaterial na sua vida quanto presente na sua mente.

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