sábado, março 25, 2006

O Anzol


foto syl

“Eu não sei se hei-de fugir ou morder o anzol,
Já não há nada de novo aqui… debaixo do sol….”
Rádio Macau


Dir-se-iam estúpidos, irracionais estes peixes, que nem sequer pela observação sistemática do destino fatal, dos seus irmãos, primos e restante família, se deixam assim apanhar simplesmente, mordendo o anzol.
Mas como todos os outros, também ela, fresca, brilhante, que se considerava ladina e coisa e tal, mordeu-o!
Ficou a observar nitidamente o fio invisível que a puxava para mais perto do céu. (Ou Inferno, que são a mesma coisa).
Não resistiu. Até ajudou. Deixando-se flutuar obediente. Claro! Já não há nada de novo aqui ou lá onde se encontrava.
Mordia mais um pouco o anzol, com medo de ficar pelo caminho e saboreava o suave veneno que a entorpecia e excitava. Enrolou-se voluntariamente no fio mesmo não o vendo, sabia que ele estava lá.
Nada de medos. A excitação de chegar à superfície era grande, queria ver o pescador.
Aquele que com tão simples truque, continuava a fazer o que sabia. Pescar o peixe, vê-lo vibrar à sua frente, arfar por ar, e por fim… desfalecer.
Ela era curiosa e jogadora, deixou-se levar em todos os passos.
Quase em coma podia ainda sentir os efeitos nocivos, mas não se arrependia.
Queria saber como seria o fim. Ser a ementa do pescador, ser por ele devorada e saboreada. Apostava que ele iria sentir-lhe a diferença.
Sabia de todos os outros peixes ao seu lado, provavelmente enfeitiçados pela mesma canção. Só não sabia que os seus destinos seriam o mesmo.
Acabou vibrante e brilhante, como todos, numa foto de turista.

sexta-feira, março 24, 2006

No entanto atenção!



...aos incautos nem só com cordeis pacatos e discretos se atam os meus embrulhos, se tecem as minhas histórias...

quinta-feira, março 23, 2006

Lembro que me sentia algo como Alice, perdida entre espaços mais ou menos recônditos dentro do meu cérebro. Na maioria, o vazio.
De quando em vez, um túnel escuro e pouco apelativo.
De repente, abriu-se uma porta fechada que lembro tinha tentado ocultar de tal forma que a esquecera.
Abriu-se de uma forma urgente e autoritária, nada houve a fazer….
A curiosidade foi forte, de dentro irradiava apenas um leve clarão. Espreitei, e vi.
No centro uma amontoado de, ….de…. parecia fio ou fios, ou …cordéis!
Eram pedaços de cordel, de várias cores que quase não se distinguiam. Perto da porta estava a ponta. Cordel de mercearia, daquelas que já existiram e das quais querem agora fazer um revival tipo “pastiche”.
Peguei-lhe e puxei.
Achei engraçado. Lembrou-me qualquer coisa.
Puxei mais e vi que a ele estava atado a outro, diferente ou semelhante, não sei bem distinguir, estava atados, ou colados, ou mesmo fundidos com aquilo que me pareceu AÇÚCAR , refinado ou puro de cana. Colado com água (de lágrimas?) ou caramelizado (de temperaturas de paixões febris).
Segurei bem a ponta e levei comigo. Parece que um fio interminável me seguiu. Eu não sei. Não fiquei, nem olhei para trás.