terça-feira, junho 27, 2006

ADEUS (revisitado)

By Letititia (2006)
By Mélodie (2006)
À Mélodie e à Letitia... ou ... como se vê o "Adeus" aos 16 anos.













quarta-feira, junho 21, 2006

ADEUS

Quantas vezes já sentimos que o “poeta” nos “tirou as palavras da boca”…
Quantas nos vimos retratados pelo letrista de uma melodia mais dolente…
Nunca tanto como aqui…
Tanto de querer ler de voz alta,

de querer repetir com entoação as dores do poeta,
que também são as minhas.
Ele, eu…
Há muito tempo atrás...agora, sempre!









Adeus

Já gastámos as palavras pela rua,
meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de a apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das
esquinas
em esperas inúteis.

Meto as mãos nas algibeiras e não
encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para
dar um ao outro;
era como se todas as coisas fossem
minhas:
quanto mais te dava mais tinha
para te dar.

Às vezes tu dizias: os teus olhos
são peixes verdes.
E eu acreditava.
Acreditava,
porque ao teu lado todas as coisas
eram possíveis.

Mas isso era no tempo dos
segredos,
era no tempo em que o teu corpo
era um aquário,
era no tempo em que os meus olhos
eram realmente peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco, mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.

Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor,
já não se passa absolutamente
nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.

Não temos já nada para dar.
Dentro de ti
não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão
gastas.

Adeus.


“Os Amantes sem dinheiro” (1950)
Eugénio de Andrade




terça-feira, junho 20, 2006

SONHO DE UMA NOITE DE VERÃO
Dois estranhos conheceram-se no meio da floresta numa noite de verão.
Duas almas que navegaram na torrente dos dias, deram à costa no mesmo sítio.

Era a noite mais quente de todos os verões.
O calor que incandescia do solo e de todos os elementos terrestres empurrou-os para o mar.
Ficaram ali …frente à imensidade, namorando-o, cada um à sua maneira desejando-o, cada um com a sua urgência.
Olharam um para o outro e desejaram-se com os náufragos desejam terra firme, como se deseja o mar para aplacar o calor da terra ardente.
Entraram por ele dentro com a sede da seca mais intensa.
Depois, foi o sonho que reinou…
A lua caiu no mar e diluiu-se em milhares de fragmentos de luz, num rasto de estrelas cadentes seguindo cada movimento.

Belo, belo… belo demais para ser verdade.
Findou a noite, acabou o calor, terminou a sede, a solidão, o sonho…
De volta à realidade nada restou.
Porquê meu amor?

segunda-feira, junho 19, 2006

VINHO, POESIA e VIRTUDE
Devemos andar sempre bêbados.
É a única solução.
Para não sentires o tremendo fardo do tempo que te pesa sobre os ombros e te verga ao encontro da terra, deves embriagar-te sem cessar.
com vinho, com poesia, ou com a virtude.
Escolhe tu, mas embriaga-te.
E se alguma vez nos degraus de um palácio, sobre as verdes ervas de uma vala, na solidão morna do teu quarto, tu acordares com a embrieguez atenuada, pergunta ao vento, à onda, à estrela, à ave, ao relógio, a tudo o que passou, a tudo o que murmura, a tudo o que gira, a tudo o que canta, a tudo o que fala; pergunta-lhes que horas são: "São horas de te embriagares. Para não seres como os escravos martirizados do Tempo, embriaga-te sem descanso. Com vinho, com Poesia, ou com a virtude".
Charles Baudelaire